Antes terra morta, agora mata atlântica


Quase 500 hectares de mata já foram recuperados na fazenda Bulcão


Fotógrafo Sebastião Salgado comemora, ao lado da esposa Lélia Wanick, o sucesso do projeto ambiental desenvolvido em sua propriedade no leste de Minas. No local, 1,5 milhão de mudas já foram plantadas

 
Transformar área de pastagem em floresta. Foi com essa ideia, que a princípio soou como absurda, que tudo começou. Acostumados a percorrer o mundo em função do trabalho com a fotografia, Sebastião Salgado e a mulher, Lélia Deluiz Wanick, viram de perto a ação do homem sob a natureza. “O ser humano é a única espécie que destrói a casa de outras milhares”, observa Sal­gado. Incomodados com o tamanho do estrago, decidiram fazer sua parte. “Nem que fosse uma gota no oceano, queríamos dar nossa contribuição ao mundo”, pontua Lélia. E assim foi criado o Instituto Terra, uma organização não governamental, que trabalha com a recuperação da mata atlântica e a educação ambiental na região de Aimorés, cidade natal do renomado fotógrafo mineiro.

 Cidade de Aimorés

Passados 10 anos, a semente bro­tou. Quase 500 hectares de ma­ta já foram recuperados na região do Vale do Rio Doce. Mais de um milhão e meio de árvores foram plantadas. O pasto deu espaço a uma floresta. No lugar do gado, mudas de plantas. No início deste mês, o casal esteve no Instituto Terra para mais um desafio: implementar a educação ambiental nas escolas públicas do município e região. A revista Viver Brasil esteve lá para conferir o lançamento do projeto e conversou com os fundadores do Instituto Terra.

 Hidroelétrica no Rio Doce - Aimorés - MG

A sede funciona na fazenda Bulcão, antiga propriedade rural da família Salgado. Junto com os outros produtores rurais, o pai de Sebastião foi um dos responsáveis pela destruição do ecossistema da região do vale.  “Naquela época, não se via utilidade para floresta. O comum era cortar ou queimar as árvores para fazer pasto”, diz o fotógrafo. A atividade extrativista também devastou grande parte da floresta. Há 50 anos, havia 5 madeireiras em Aimorés. Hoje não sobrou nenhuma. Da mata atlântica existente naquele período, restou pouca coisa.

Confira o vídeo desta matéria.

No viveiro do Instituto Terra, o casal observa manejo das mudas
No viveiro do Instituto Terra, o casal observa manejo das mudas
“Um dia estava no IEF e meu te­lefone tocou. Era o Sebastião dizendo que queria minha ajuda para recuperar uma área devastada. Na época eu nem sabia quem era o famoso fotógrafo Sebastião Salga­do”, recorda-se o professor Célio Valle, diretor de biodiversidade do Instituto Estadual de Florestas. O ambientalista sobrevoou a região com o casal. Sugeriu que transformassem o local em uma Reserva Particular do Patri­mô­nio Natural. Os dois encararam o desafio. Fizeram então a primeira RPPN em cima de uma área degradada.


O início não foi nada fácil. “Não tínhamos conhecimento técnico. Apanhamos e aprendemos na marra”, recorda-se Lélia. Na primeira plantação, houve perda de 60% das mudas. Foi preciso experimentar até acertar. Hoje Lélia se emociona ao ver as antigas mudas transformadas em árvores. “Esta­mos satisfeitos com os resultados alcançados, mas ainda há muito o que fazer. O trabalho aqui vai ser eterno”, avalia Lélia.


O programa, que teve parceria de grandes empresas como a Na­tura e a Vale, lançado no início deste mês, é prova dessa continuidade. O objetivo é preparar todos os professores do ensino básico, para transmitir a educação ambiental às crianças. “Nossa vontade é nos pró­ximos 25 anos atingir toda a ba­cia do Rio Doce, composta de 250 municípios, levando a uma transformação total de comportamento ambiental para as gerações futuras”, idealiza Salgado. 


Em relação à conscientização e educação ambiental do Brasil, o casal, que mora em Paris, acredita que as coisas estão melhorando por aqui.  “Vejo que existe uma preocupação dos brasileiros com o futuro. As pessoas começam a se questionar se vamos ter água, eletricidade suficiente no país. Espero que essa preocupação se transforme em pressão sobre o se­tor público e em ações coletivas e individuais também”, opina Salgado. “En­quan­to não tivermos um cotidiano consciente, as coisas dificilmente mudarão. Mas na Europa também não está muito diferente. A consciência ambiental precisa evoluir muito em todo o mundo”, completa Lélia.
A preocupação ambiental e o trabalho desenvolvido no Instituto Terra foram a inspiração para o mais novo projeto de Sebastião Salgado, o Gênesis. Diferen­te­men­te da maioria dos trabalhos do fotógrafo, que evidenciam dramas e tragédias humanas, dessa vez é a natureza que está sendo clicada. Ele e a esposa Lélia estão percorrendo o planeta em busca de áreas ainda intocadas pelo homem. “Em outros momentos, temas como a exploração do trabalho, a fome e a miséria me sensibilizaram. Neste momento, minha maior preocupação é com o mundo em que vivemos”, enfatiza Salgado.
Diversas espécies da mata atlântica são cultivadas no Instituto Terra
Diversas espécies da mata atlântica são cultivadas no Instituto Terra

 

Instituto Terra

- É uma organização não governamental fundada por Sebastião Salgado e Deluiz Wanick. Atualmente, ela é a presidente e ele o vice
- O projeto prevê a recuperação da mata atlântica de toda a área da antiga fazenda Bulcão, 700 hectares, além da educação ambiental para as crianças da região do Vale do Rio Doce, em Minas
- Já foram recuperados cerca de 450 hectares com a plantação de mais de 1,5 milhão de espécies. Quase 30 nascentes também já foram recuperadas . A intenção é chegar a 100
- 77 escolas da região já tiveram a educação ambiental incluída na grade
- Grandes instituições e empresas como a Vale, a Natura, Emater, Sebrae, o IEF, a Semad, os governos de Minas e do Espírito Santo, assim como doadores internacionais são parceiros do projeto
- O Instituto Terra está aberto para a visitação pública
Fonte: www.institutoterra.org
Crianças recebem lições de educação ambiental
Crianças recebem lições de educação ambiental

Projeto Terrinhas

- Criado em 2005, o programa forma monitores ambientais mirins. A primeira turma formada (350 alunos) hoje constitui um grupo de meninos e meninas, com idades entre 8 e 14 anos, preparados para agir em defesa do meio ambiente e da mata atlântica
- Os alunos escolhidos para se tornarem os monitores ambientais mirins são denominados de Terrinhas e recebem informação para atuar nos projetos pedagógicos de educação ambiental desenvolvidos nas escolas
- O projeto já atingiu mais de 3,2 mil alunos da rede de ensino pública e particular de Aimorés, somando mais de 12,8 mil pessoas da comunidade local como beneficiários indiretos. O Projeto Terrinhas já foi selecionado por duas vezes pela Unesco como modelo de educação ambiental. Fonte: Viver

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